Sempre
há esperança
Esta
noite, às 20:00
hs, pela Rede Bandeirantes, terá lugar
o segundo round do embate entre a utopia
e a esperança. Lula vs. Alckmin. O
primeiro round foi vencido – por pontos,
e estreita diferença – pela
utopia. Temos esperança neste segundo.
Aliás, característica do povo
brasileiro: sempre ter esperança.
Contudo,
esse mesmo povo tem uma outra característica: é extremamente
utópico. Pensa e crê em
fantasias como se estas fossem realidades
sólidas, comprováveis
e factíveis.
Já por essa razão, devemos
considerar um primeiro ponto de equilíbrio
entre os dois contendores: tanto há esperança
como defende-se a utopia.
Temos
fé que, para esta luta,
a platéia não continue
a seguir a teoria proposta por Ludwig
Wittgenstein em seu Tractatus Logico-Philosophicus,
em que ele afirma que o homem se encontra
numa sala e dela precisa sair; só que
todas as portas são falsas – pintadas
na parede. O homem tenta exaustivamente
abri-las, mas é claro que não
consegue. E – pior – não
consegue ver que a única porta
verdadeira está atrás
dele. Para ganhar a liberdade, bastaria
virar-se.
Mas
a utopia – as portas pintadas – tem
um aspecto mais bonito, parece mais
atraente... E o homem insiste, tenta
abri-las. Num relance, olha para trás,
vê a porta verdadeira, mas despreza-a:
uma porta com aspecto de velha, com
a maçaneta grosseira e enferrujada
jamais poderia ser a saída para
a luz...
E
ali estão as outras, todas
novas, reluzentes, parecendo chamá-lo.
Uma delas tem de ser a saída,
ora bolas!
Esquece-se
o homem de que a luz advém
das trevas – a dualidade das
coisas está aí para comprovar:
só pode haver conceito de luz
se confrontado com o de escuridão.
Mas
voltemos ao nosso ringue. No corner
vermelho, a utopia e no verde, a esperança.
Ambos os contendores já disseram
e alardearam possuir golpes mortais,
fortes o bastante para levar o adversário
a beijar a lona. Os analistas de plantão – leia-se
comentaristas do tipo que preferem
dizer quadrilátero em vez de
ringue – afirmam que a utopia
há-de derrotar a esperança
usando os seus próprios pontos
fracos. A imensa maioria baseados no
passado, em lutas anteriores, em contendas
que, correta ou incorretamente, foram
vencidas. Já a esperança
acredita na vitória por nocaute
já nos primeiros minutos do
embate. Conta, para isso, com uma fraqueza
escarrada do adversário: falta
de jogo de pernas – leia-se alicerce
intelecto-cultural.
Ao
mesmo tempo, parece – aos
outros comentaristas, aqueles que são
pelo menos um pouco mais preparados – que
a esperança possui uma melhor
capacidade de absorver golpes. E não
tem queixo de vidro. Prova disso está no
fato de até mesmo seu preparador
ter chegado a desacreditar em sua vitória
e ter até dado a impressão
de estar buscando, junto à utopia,
uma segurança, uma aliança
ainda que subliminar ou, se quiserem,
uma garantia de que não viria
a ser perseguido em tempos posteriores.
Mas
temos de ter fé... No mínimo
a mesma fé que tem a esperança
de que conseguirá encaixar um
direto na utopia, pondo-a completamente
fora de combate.
E
nós, na platéia ao
lado do córner verde, estamos
torcendo para que a utopia, ao ser
atingida, continue seguindo a teoria
de Wittgenstein, ligeiramente modificada:
sobre aquilo que é indefensável, é mais
aconselhável calar.
E,
em seu silêncio, acabará por
mostrar e expor o queixo de vidro ou
o fígado – este, que já deve
estar bastante prejudicado – para
o golpe de misericórdia, o cruzado
de direita que, definitivamente, fará com
que ela, a utopia, vá para o
lugar de onde jamais deveria ter saído,
ou seja, o chão com toda a sua
poeira. |